Não sei precisar o exacto momento em que me perdi de amor pela poesia. Sei que foi cedo, muito cedo. Talvez nos olhos azuis cheios de poemas do meu avô. Talvez no abraço apertado e cheio de rimas da minha avó. Talvez no verde da aldeia que me viu nascer e crescer, livre e leve, com o coração sempre à flor da pele. Talvez no momento em que escrevi os primeiros versos, com sete ou oito anos, rimas infantis das quais pouca memória guardo.
Aquilo que sei é que metade de mim é feita de poemas. Que só assim consigo expressar-me enquanto verdade e enquanto mulher. Só sei que a poesia é a minha cura. A minha arma de arremesso contra o mundo e contra a dor. A flor que rego todos os dias, pela manhã, e que vejo crescer feliz e viçosa, sem perder pétalas ou trocar o verde pelo amarelado do tempo que se esvai. Só sei que a poesia é a minha base, o lugar onde me fiz e me refaço, o porto seguro em que ancoro aquilo que sou, aquilo que não digo com a boca por vezes seca e triste. A poesia é o meu refúgio também, o lugar secreto onde me aninho e encolho os joelhos e liberto a estranheza que me habita ou a iminência de uma antiga melancolia que teima em reaparecer.
Por isso digo que a poesia cura, que a poesia é a cura de todos os dias nem sempre cheios, do travo amargo da solidão, das ausências e das partidas, da saudade e dos amores e desamores que nos atravessam o caminho. A poesia é a cura para os corações perdidos, para os que vagueiam sem sentido ou sem sentir, para os que não se reconhecem nem se sabem dizer, para os insones inconformados e para os que amam sempre em demasia. A poesia é a cura, seja qual for a maleita.
[O livro de poemas da fotografia é o Sonetos, de Florbela Espanca, a minha poeta preferida de sempre.]
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